sábado, 24 de setembro de 2011

Poesia. Um tipo de magia muito especial


A poesia surgiu em vários momentos da minha vida. Eu como leitora, ouvindo e me emocionando. Como estudante, tentando entender como esta mágica se fazia. Como bruxa, entendo esta magia por fim. Trazendo o espírito dos bardos, percebendo o quanto essa palavra, dentro de versos e sons, pode tocar fundo. E também  como bruxa, senti a necessidade de expor meus sentimentos, dúvidas e emoções assim. É a maior magia com certeza, a que encontra mais fácil seu caminho, a que transforma mais derradeiramente. Aqui, vou colocar algumas das minhas poesias, não para me dizer poeta, mas para tentar tocar alguém, que como eu, um dia, fui atingida por este feitiço que as palavras carregam em si.


Magia

Descobri a poesia em mim
magia
digo tudo assim
e não me faço entender
não é preciso

é mágico
antigo
lua crescente
físico e espiritual

Descobri a palavra nessa poesia
Abracadabra
A palavra, a mágica

De dizer tudo em pouco tempo
Numa folha em branco
Imprimir o pensamento
A emoção
A solidão


Descobri a compreensão em mim
De dentro de mim
Nas teorias e textos
Nas técnicas e sustos
Nas discussões e medos

Magia isso sim
Apesar de não entender

Descobri, não é preciso
É fundamental
Único
Impreciso e viral
Penetrante, visceral
Sozinha à noite
Ou no ônibus lotado

A palavra vem
Se combina com ninguém

Descobri, isso é magia
Milagre
Ciência ou razão

Não sei não e sei sim
É um termo de primavera depois do frio


As poesias a seguir surgiram em meio a rituais, e com meu trabalho com o Oráculo da Deusa. As poesias traduzem a emoção do momento e as descobertas.

Senhora da luz

Branca, radiante
Movediça, errante
Lua da luz de sol
Da luz de céu
Da luz da noite

Lua dos bruxos
Namorados

Astrônomos
Lua da vida
Do medo
E do medo da morte
Lua dos lobos
Das mulheres

Em meio à mata
Nas estradas escuras
Iluminando as casas remotas

Os olhos dos gatos
Abençoando um ritual

É minha senhora
Um manto de brilho
Um beijo de amiga

Roda com seus raios fulgor
Brinca seu sorriso fino
Desaparece e volta
Dona do desejo de amor
Do solo de Jorge
Fada de prata
Bola de alabastro
Mãe de luz
Abençoando as que dão á luz
Tal e qual


Inspiração
Emoção
Orientação
Sem dúvida, é a senhora das senhoras



Oração de Yule

Vem meu coração
Aquecido por um cobertor
Vem meu coração escondido na escuridão
E descansar do até agora


Uma semente de alegria e luz já plantada
Nesse tempo, germinar e explodir
Mil cores na próxima primavera


Agradeço a semente em meu coração
Agradeço a oportunidade de entrar em mim
Ver meus sonhos no escuro
Sentir o vento gelado
Meu rosto vivo!



Que girar a roda seja abençoado
Que este meio de caminho sirva para nos recompormos
Nos prepararmos para a próxima estação


Kali

Negra
Destruidora da maldade
De demônios fora e dentro

Ceifa vidas
Morte sem sofrimento
Solução para o caos
Com seus lábios de hena e bétele
Seu colar de cabeças
Arrasadora dos maus

Força feminina
Guerreira

Meu lado escuro sem sombra
Esteja comigo na hora da minha morte



Ostara

Deusa da luz branca
E flores coloridas
O grito da lebre já se ouviu
Tua presença já é certa
O calor e a fertilidade

Bom humor e felicidade
Este é teu espírito
Habitante de toda natureza
Um toque que fará crescer
Meu momento.

As deusas não vêm por acaso...


Um dia, um pouco indisposta por estar menstruada, uma mulher a meu lado me sugeriu tomar um remédio para conter o fluxo, e com o tempo, tomando este “remédio” regularmente, a menstruação desapareceria por completo. Como boa ariana que sou, tive uma vontade louca de dar-lhe uma porrada, mas acabei me apiedando dela. Pobre, não sabia mesmo o que estava dizendo, e fazendo!

Envolvida num trabalho com mulheres, tanto como bruxa como professora, a gente vê muita coisa que entristece a alma. Mulheres se perdendo cada vez mais. É só ligar o televisor e ver a exposição imoral do corpo, que deveria ser sagrado, ou remexer na memória e perceber os tantos golpes da barriga que você ouviu falar, as plásticas desnecessárias, os ciclos naturais se perdendo entre as mulheres. Isso me deprime, mas também me irrita. Por sorte, ainda conheço muita mulher de verdade, mas, para as irmãs que se perderam acabei escrevendo também.



E todas somos uma deusa

Sangra, não morre
Dá a vida, ainda tem vida
Cuida, não cansa
Corre com os lobos, não teme



Este poder, mistério
De onde vem assim?
De todas as funções exercidas?
De um coração sem fim?


Dentro da tenda vermelha
Conversa e ouve
Dentro da tenda vermelha
Mulheres sãs
Amigas, irmãs, mães, sábias



Deusas em tempo integral
Escutando queixas e pedidos
Conservando a leveza e o espírito
Essencial


Mas... Reconhecendo uma nas outras
A decadência moral
Irmãs perdidas
Vergonha e lágrimas
Maternidades vendidas
Corpos transformados



Rompe o sangue sagrado
A ruga sábia
A boca trêmula
As mãos de manchas senis
E envelhecer belas ao natural
Dignas e divinas

Onde estão suas Deusas?
Por que as mataram assim...



Mas ainda há Deusas em muitas mulheres
Em mim.


Aviso

Ouve, mulher que sangra
Este sangue é essencial
É ser fêmea
Ser sagrada, natural


Sente este sangue escorrer de dentro de você
Tenha orgulho dele
Recebe-o com emoção
Não o impeça de chegar a cada mês
Completar seu ciclo

Porque é você!

Ouve, mulher
Você sangra
Um motivo especial
Diferencial
A mãe te deu este poder

A avó te ensinou certo
Não se perca...

Ouve, antes que seja tarde
Sangue não deve ser lágrima
Seja quem você é
Tenho medo por você, mulher que sangra e não quer sangrar
Pena, preocupação, irmã minha
Não corta esse vínculo com as tuas ancestrais
Com a grande mãe

Ouve! É só o que posso te dizer.
Sente! É o que deve fazer.
E o medo não virá, a dor também não
A natureza cobra o que dá.
Como você vai dizer? Não sabia...
Agora já sabe


Cresci num bairro antigo e tradicional, cortado por um córrego. Minha infância foi brincando perto dele, quando era bruto e margeado de capim. E um dia, passando ao lado do rio, hoje em meio a um parque linear, senti uma tristeza tão funda, ao perceber a agonia do rio e virou poema essa emoção



O rio da minha infância

O meu velho rio poeta
Que ouvi na infância
Senti na adolescência
Morreu no concreto



O meu velho rio
Agonizou no escuro
Sem cheirar bem
Não meteu medo em ninguém
Não mais provocou inspiração


Meu velho rio
Tão morto agora como os cães que nele jogaram
Virou alma penada
E do meu choro interno
Represado no meu coração

Está um pouco da sua água límpida da minha infância

Este velho rio
Estirado em meio a avenidas
Preso por grades de cimento

Parte entubado feito moribundo de UTI
Está lá pra gente se lembrar
Que ele é um espírito
Que ele é um caminho
Que ele é sangue que corre nas veias da terra
E é lama, alga
Detritos
Que ele é o que fizemos dele
Que ele é o que atiramos nele



E debaixo de todo esse descaso e desamor
Abaixo do desrespeito
Correndo baixinho
Ele continua lá
Meu rio da infância

Meu rio poeta
Com nome indígena
Com vontade de voltar



Ser bruxa, nem de longe, é estar fora do alcance dos sofrimentos, das dores. Isso não é problema, é lindo, pois é parte da vida, do crescimento. Em alguns momentos de dor, de confusão, veio a poesia para tirar fora de mim o que estava me sufocando. Magia pura...





Poema que não acabou

E me nega tua presença
A pele morena, indecifrável
Os olhos profundos, corvos num céu de crepúsculo
O sorriso largo
O queixo definido
Me nega entrar nos pensamentos

Mesmo que uma vez ou outra
Ama outra gente
Conta seus segredos ao espelho
Não consegue fazer que eu esqueça
Desapareça
Mas consegue que chore escondida e amordaçada
Não pode fazer eu não querer sempre
E esperar
Isso não pode
Mostra outro destino

Me vê partindo mais e mais
E voltando pelo e-mail e telefone
Me faz remota, ignota
Pertinaz
Me faz renúncia, mistério
Fingir me faz
E uma história que parece não ter jeito
Nem final feliz
Pode ocorrer para sempre
No peito
Pode nunca acabar
Assim como este poema 



Isabela

Pra quem deixarei, filha que não nasceu, meu livro das sombras?
O que direi à Mãe sobre meu ventre que secou?
Como drenarei minha mágoa escorrida nessa terra forte?

Não sei...

Quem virá te substituir, cara filha?
Quem verá os cabelos grisalhos que terei?
E quem ouvirá as histórias da velha bruxa que serei?

Não sei!

Filha, não sabe nada sobre o homem que não te quis.
Só eu te quis um dia.
E só, nada pude fazer.
Ou podia e não fiz...

Agora, o medo das páginas amarelarem sós
Virarem pó...



Agora, sei, filha!
O vento jogará este pó na terra
Quem sabe te encontrarão
E poderá ler o que tanto te escrevi
Poderá me perdoar
Por nada ter feito...

Além de compor um livro das sombras
Com minha própria sombra
Da mãe que não tive como e nem coragem de ser.


Saber uma lição

Sai de mim
Este aspecto de tradução
Razão esperneada
Fazer tudo certo
Não de novo
Querer passar no vestibular
Ganhar na Megasena

Vem em mim
Outra vez em mim
Um querer mais e mais
E se sofrer tudo bem
Faz parte
Faz parte do todo
E cresce
Morre e renasce
Acalma

Cada um cada um
Juízo é querer saber
Não saber
E se por um momento pensar
Sem sentir
Equilibrar
Corre de novo
Amassa a folha e joga fora
Tenta

Assim aprendiz perene
De vozes antigas
Sempre e sempre
Morre e renasce
Aqui e agora
Sente o ar e o bem estar
Chuta a hipocrisia
Atrofia o grande ego
Assim ele cresce
Morre, renasce, morre, renasce
E morre por fim


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