domingo, 28 de agosto de 2011

Roda do ano

A Roda do Ano



          A bruxaria moderna tem como base ritual uma série de celebrações realizadas ao longo do ano, fundindo os antigos festivais celtas e as datas de solstícios e equinócios.
            Celebrar um ritual não se resume a participar, é preciso envolvimento, e isto implica compreensão dos processos, simbolismos e elementos que compõem o ritual em todos os níveis, do aparente ao oculto.
            Entre as culturas pagãs pré-cristãs, a melhor maneira de transmitir os conhecimentos por trás de uma celebração é o mito. A passagem do tempo e sua influência sobre todas as formas de vida foram um dos mais intrigantes questionamentos da humanidade e os mitos, das mais diversas culturas, foram a explicação simbólica desse fenômeno.
            No caso particular da Roda do Ano celta, a compreensão dos mistérios do tempo não vem na forma de um único mito, mas sim da celebração de quatro rituais associados a cada estação do ano:

Samhain – morte/renascimento; contato com o outro mundo, reinício – 01/11 – inverno
Imbolc (Óimelc) – restauração da vida, florescimento – 01/02 - primavera
Beltaine – fertilidade, apogeu, força, sensualidade, vigor – 01/05 – verão
Lughnassadh – colheita, frutificação, amadurecimento, fenecimento – 01/08 – outono

Obs.: As datas são do hemisfério norte.
          

         Posteriormente, as tradições neo-pagãs, ao resgatarem o calendário celta original, incluíram também solstícios e equinócios, usados até hoje para assinalar o início de cada estação do ano, compondo assim uma roda com oito raios que forma o calendário sazonal wiccano.

Mitos da Roda do Ano

          Os festivais celtas originais estão diretamente associados a diversas deidades do panteão celta, muitas vezes até no próprio nome do festival. Lughnassadh, por exemplo, é a festividade ao Deus Lugh, o grande guerreiro da mitologia irlandesa. Outro nome de Imbolc é Brigantia, uma referência clara à Deusa Brighid, que também pode ser identificada na tradução de Óimelc, lactação das ovelhas.


          Beltaine são os Fogos de Bel (Belenos), enquanto que Samhain (literalmente Fim do Verão) possui ligações íntimas com o Deus Dagda e a Deusa Morrighan, também do panteão celta irlandês. A compreensão real do significado de cada festival, seus símbolos e associações, para os celtas antigos, só pode ser atingida através da compreensão dos mitos que os cercam.
         Mas qual é o tema chave da Roda do Ano? Como interpretá-la sem conhecer os mitos celtas?
         Mesmo sem conhecimento dos mitos, é possível intuir seus significados mais profundos quando observamos os temas centrais de cada festival. Este também é um exercício de observação da natureza.
          Samhain, além de ser um importante festival celta, marcava o início do ano.


          Curiosamente, para os celtas, o ano começa no inverno, um período de frio e escuridão, introspecção e recolhimento, especialmente para uma sociedade que vivia em uma região de baixíssimas temperaturas e sem as comodidades da vida moderna. Por analogia, começamos a nossa vida no escuro do ventre materno, para depois nascermos e encararmos a claridade do dia (não é à toa que a expressão Dar à luz tem ligação com o nascimento), assim como a primavera traz nova vida aos bosques, lagos e ninhos que vicejam com filhotes após meses de frio no inverno. Não por acaso, Óimelc, a lactação das ovelhas, é o nome  desse período (aliás, atente para a semelhança do som da palavra Óimelc com a palavra milk, leite em inglês).
          Nos meses quentes do verão (Beltaine,) a vida floresce no seu apogeu, e todas as criaturas multiplicam-se sobre a terra aquecida pelos raios do sol. É o período dos acasalamentos e da fecundação, que produzirá frutos no outono, marcado pelo festival Lughnassadh, a celebração ao Deus Lugh, (diz o mito que Lugh criou este festival em homenagem a sua mãe de criação, Tailtiu).
          O ano chega ao fim quando começou, em Samhain, o fim do verão (na verdade a aproximação do inverno assinalada pelo Outono, é que os celtas marcavam os anos em duas metades, a clara e a escura), a morte do ano solar, o mergulho de volta à escuridão.
            Assim, vemos que depois da escuridão vem a luz da primavera, desenvolvendo-se até atingir seus apogeu no verão, para fenecer e frutificar no outono e por fim, perecer no inverno, isto tudo em um ano. É bom ressaltar, que as datas acima destacadas são determinações posteriores, pois os antigos celtas não tinham um dia específico, eles sentiam a presença da nova estação a partir da observação do tempo.
          Podemos identificar as mesmas fases em todas as formas de vida, nas árvores, insetos, em nós mesmo e até nos objetos. Tudo nasce, cresce, multiplica e morre. O tempo cronológico não importa, o que vale é que tudo obedece a uma ciclicidade constante, imutável em sua mutabilidade. Perceber essa mutabilidade é um dos segredos para harmonizar-se com a natureza, inclusive com a aceitação da morte. É desta observação que absorvemos a simbologia da Roda do Ano. Mas será que é só isso que nos ensina a Roda do Ano?
          Certamente que não. Na verdade, essa é a percepção mais superficial da Roda do Ano. Afinal, Samhain, o ano novo celta, não pertence ao ano que se acaba, nem ao que se inicia; é um período intermediário, fora da realidade que conhecemos, fora da ordem que entendemos. É o começo e fim ao mesmo tempo, uma afirmação de que, no fim das contas, não existe começo nem fim. Afinal, todo o inverno traz uma nova primavera, toda a noite anuncia um novo dia, e toda a morte sinaliza um novo ciclo, uma nova maneira de se manifestar na natureza, seja como pó, seja como lembrança. E não podemos dizer que quando nos lembramos de alguém que já morreu, esta é uma maneira de revivê-lo?

A Roda do Ano Wicca

          A bruxaria moderna, a Wicca, por exemplo, incorporou as datas e quase todos os nomes dos festivais celtas originais, e agregou a estes um novo mito, conhecido como O romance da Deusa e do Deus. Para fazer sentido, essa versão não pode começar no ano novo celta, mas sim no equinócio de primavera.


Festival
Simbologia
Equinócio de primavera - Ostara
Deusa jovem e fértil, Deus jovem e vigoroso – encontro.
Beltaine
União consumada entre ambos. Deusa concebe.
Solstício de Verão – Litha/Midsummer
Apogeu do Deus (início do declínio), plenitude da Deusa.
Lammas/Lughnassadh
1ª colheita (Deus enfraquece) – Deusa grávida.
Equinócio de outono – Mabon
Última colheita. Deus começa a envelhecer. Deusa entristece.
Samhain
Morte do Deus. A Deusa recolhe-se.
Solstício de inverno - Yule
Deusa dá à luz o Deus.
Imbolc
Deusa virgem. Deus criança.


Obs.: Ostara, Litha e Yule nomes de origem germânica. Lammas, nome de origem saxã.

          Observamos que, apesar da diferença entre os mitos, a temática é a mesma. O ciclo ainda permanece. A roda gira no eixo da vida e morte. Na Wicca, este ciclo fica materializado na presença do Deus e da Deusa.


Festival
Data no hemisfério norte
Data no hemisfério sul
Ostara
21 de março
21 de setembro
Beltaine
01 de maio
01 de novembro
Litha/Midsummer
21 de junho
21 de dezembro
Lammas/Lughnassadh
01 de agosto
01 de fevereiro
Mabon
21 de setembro
21 de março
Samhain
31 de outubro
30 de abril
Yule
21 de dezembro
21 de junho
Imbolc
01 de fevereiro
01 de agosto


Norte ou Sul?

          Há várias controvérsias em relação à celebração da Roda do Ano na bruxaria moderna. Afinal, devemos seguir o calendário do hemisfério norte, ou sul, já que as estações do ano são opostas.
          Essa inversão, contudo, não impede que a Roda Astrológica seja aplicável aqui no hemisfério sul, assim como não impede que as festividades cristãs sejam celebradas aqui fora do contexto em que foram criadas na Europa, assim não impediria celebrarmos a Roda do Ano seguindo a ordem do hemisfério norte. Por outro lado, a realidade climática que vivemos no hemisfério sul, sobretudo na maior parte do território brasileiro, é bem diferente da representada nos mitos e lendas celtas, e mesmo no wiccano.
          A melhor resposta para esta questão é, como sempre, aquela que faz mais sentido no seu coração. Valha-se do conhecimento adquirido para determinar de que forma cada estação do ano influi na sua vida. Compreenda os processos, observe suas reações, mas, antes de tudo, sinta! Este é o segredo para que a magia da Roda do Ano flua através de nós. Só quando abrimos para a percepção do mundo que nos rodeia é que voltamos fazer parte dele. Só quando voltamos a fazer parte do mundo é que podemos acessar os Deuses e Deusas, os espíritos e forças da natureza viva. Encontre seu próprio critério, que pode ser pela força da estação do ano, ou pela influência da egrégora, a força espiritual que liga todos os seres num só momento, numa só celebração. Quem sabe até mesclar os dois critérios? Mas, independente da sua escolha, celebre, sinta, vivencie a Roda do Ano, pois você vai sentir as mudanças, a conexão, e tudo vai ser muito mais intenso e inspirador.

Formas de celebrar a Roda do Ano


          Como você comemora seu aniversário? Dá uma festa? Chama parentes e amigos para celebrarem juntos? Resolve se recolher, viaja?... Pois então, a celebração da Roda do Ano pode ser feita em conjunto ou solitariamente. Com uma festa, um jantar, ou um ritual discreto. Isso também depende do que diz seu coração, como você está e sente o momento. Não há uma receita, mas é bom incluir no seu ritual elementos referentes ao festival. Por exemplo, flores em Ostara, quem sabe fazer um pudim de leite em Imbolc? Escrever um poema, acender velas e incensos, dar boas vindas à nova fase que vai começar. Começar um projeto em Litha, ou se recolher em Yule, tudo é válido. Você pode se basear num ritual proposto num livro de bruxaria, mas também é bom que você crie uma forma especial e única para sua celebração, que pode mudar a cada ano. Ouça seu coração.
         
          Aqui, uma representação mais completa da Roda do Ano no hemisfério sul em que você pode basear seus rituais.


quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Mudanças...

Os treze objetivos de um bruxo
(segundo Scott Cunningham)


(É no caldeirão que as mudanças ocorrem...)



1 - Conheça a si mesmo.
2 - Conheça a sua arte.
3 - Aprenda.
4 - Use seu conhecimento com sabedoria.
5 - Alcance o equilíbrio.
6 - Mantenha suas palavras em ordem.
7 - Mantenha suas ideias em ordem.
8 - Celebre a vida!
9 - Sintonize-se com os ciclos da Terra.
10 - Respire e alimente-se corretamente.
11 - Exercite o corpo.
12 - Medite.
13 - Honre o Deus e a Deusa.



Começar a praticar bruxaria traz mudanças na sua maneira de ser. Os treze objetivos do bruxo passam a nortear esse processo de mudança. Eu disse no meu texto de abertura que colocaria neste blog textos que me ajudaram, e experiências pessoais que podem orientar um bruxo iniciante. Vou relatar aqui algumas mudanças que ocorreram em mim, o que venho aprendendo...



- O conceito de pecado sumiu!!!

         Nasci em lar cristão, aprendi os preceitos cristãos e consequentemente a me martirizar com a ideia de pecado. Eu tinha que me sentir pecadora, submissa 24 horas por dia, não podia elevar meus olhos a deus, mas sim ajoelhar-se perante ele e pedir perdão. Quando entrava na igreja, nos cultos de domingo, a primeira coisa que fazia era me ajoelhar, abaixar a cabeça e pedir perdão. Isso me atormentava, pois eu sentia culpa por praticamente tudo que fazia. Eu era adolescente, se ouvia rock e gostava, estava pecando, se sentia desejo por algum rapaz, estava pecando, se desejasse alguma coisa material, estava pecando. É muito difícil para um jovem se sentir tão cercado assim. Eu ficava confusa, já que não achava que tudo o que eu fazia estava errado, mas as pessoas diziam que era errado. O deus que eles queriam que eu amasse era opressor.
          Felizmente, lá pelos 16 anos, eu comecei a me libertar, um dos fatores, por incrível que parece, foi começar a gostar de rock. Ler também ajudava, pois as histórias da escola dominical não me faziam mais sentido, não batiam com a ciência, a filosofia e outras coisas que eu estava aprendendo.  Para encurtar a história, pois o processo foi um tanto longo, fui um tempo ateia, depois que me desliguei da igreja, e antes de completar 20 anos, conheci a Márcia Frazão. Comecei a me interessar pela bruxaria, a estudar e assim, em dois anos, estava me iniciando na Arte. Nesse meio de tempo, muita coisa aconteceu, conheci gente muito incrível, como a Mavesper Cerridwen, a Patrícia Fox e o Claudio Quintino Crow, e outras pessoas muito especiais. Tudo se expandiu, mas o fato que mais me chamava atenção era de não sentir mais culpa pelas minhas escolhas e atos, não me sentir mais suja, não ter mais de me ajoelhar e pedir perdão por tudo o que eu sentia. Meus sentimentos eram naturais, meus atos comuns a uma jovem, não tinha por que me sentir mal. Pecado passou a ser um conceito vazio, ou um tipo de manipulação que não me atingia mais. Tenho minha ética, meus conceitos, sei o que está certo e errado para mim, mas tudo o que eu faço é envolto em responsabilidade e liberdade de escolha, e se eu errar, isso faz parte e é necessário, e não é pecado!
         Só quero acrescentar, que não tenho nada contra o cristianismo, até admiro a filosofia, mas tenho sim contra os maus cristãos, que manipulam, enganam, fazem verdadeiras lavagens cerebrais e terrorismo com quem eles chamam de irmãos!



- Inteligência sem ação não serve para nada!

         A Arte faz-nos sedentos de conhecimento, informações, nunca mais paramos de ler, estudar, e um prazer imenso vem junto com isso, mas não colocar este conhecimento em prática faz com que ele se perca, não sirva para nada. Rituais e feitiços fazem parte dessa prática, mas fazer palestras, orientar oficinas, escrever, para um blog como este por exemplo, também são ações que podem chegar a outras pessoas e ajudá-las. Trazê-las para me ajudar, pois a cada oficina que coordeno, mais e mais aprendo.


        
- Ter respeito pelos meus estudos e passar para frente e de bom grado o que aprendi.

         Se você conhecer um bruxo que se diz sábio, que se mostra soberbo e guarda “seu conhecimento” só para ele, pois tudo é segredo de bruxaria, pode cair fora, ele não sabe é de nada.
         É aí que entra o espírito dos druidas, bardos, nossos ancestrais, que passavam o conhecimento de geração em geração. Temos que passar isso para frente também.
         E ler, experimentar, trocar ideias passa a ser vital, e também muito prazeroso.


- Saber que tudo vem na hora certa!

         É impressionante, mas a ansiedade pela resolução dos nossos problemas nem sempre faz parte do nosso dia-a-dia. Os Deuses sabem te ouvir, e também quando atender. Quando algo é oferecido é sempre o melhor, quando falta aquela grana, ela acaba aparecendo em forma de um trabalho extra, uma gratificação. Preocupações podem até aparecer, mas não tomam conta de muito tempo nas nossas vidas.



- Não fazer para o outro o que você não quer para si mesmo.

         Nem precisa comentar muito isso, não é? O bruxo acredita na Lei tríplice, na Lei do retorno (Ainda vou falar mais sobre isso), portanto, não desejo o mal, ele voltará para mim, procuro não ser ríspida com as pessoas, nem hipócrita ou mentirosa, pois não quero esse comportamento para mim. Procuro ser receptiva, respeitosa e me policiar, colocar-me no lugar das pessoas por uns instantes e tentar entender seus pontos de vista. Mas esbarro às vezes. Desde pequena sou um tanto irônica, e é muito difícil não ironizar pessoas e fatos vez ou outra...



- Acreditar no poder da transformação.

         Nem preciso ver para crer, todo esse relato já é prova da realidade da transformação. E ela vem em todos os sentidos. Até aceitar a morte ficou mais fácil, pois ela não deixa de ser uma mudança de ciclo, uma transformação. Tudo ao seu redor é passível de mudança, pessoas, a natureza, você mesmo.



- Respeitar diferenças.

         Não importa se é de opinião, física ou cultural, a gente aprende a lidar com as diferenças, a respeitar o modo de ser e viver do outro, não importando o quão distante é de você. Surge até admiração, interesse. O mundo povoado de diferenças é infinito em possibilidades. De quebra, lá se vão os preconceitos, e como isso é bom!



- Observar mais e muito!

         Ainda que eu seja uma distraída de carteirinha, observar a natureza, os ciclos da vida, as pessoas, os lugares por onde passo tornou-se uma tarefa comum, observar tudo com mais atenção e profundidade é com ler um grande livro chamado mundo.

         Provavelmente não esgotei com esse texto tudo o que mudou em mim, mas sei que sou um ser melhor, não perfeito, mas muito mais agradável, até para mim mesma. Talvez essas mudanças já estejam ocorrendo em você, e elas não vão parar de acontecer, pois temos que ser flexíveis nessa vida, pois tem muita coisa dura demais por aí.
         Até a próxima! Que assim seja e assim será!

Silvia Loose


Bruxaria Moderna

Wicca – a bruxaria moderna



          O texto a seguir é baseado em um artigo de Claudio Quintino Crow, uma das pessoas mais dispostas a passar conhecimento que eu conheço, um bardo em todos os sentidos. Estudioso da cultura celta, druidismo e outros assuntos afins. Eu coloquei algumas coisinhas ao texto, acrescentei alguns conceitos, fiz uns comentários.


Pode-se definir a Wicca como uma religião neo-pagã, ou seja, pertencente ao grupo de novas tradições pagãs que buscam, no passado, inspiração para suas práticas. Mas, tentando entender o que é Wicca, sua origem, onde e quando tudo começou, esbarramos numa outra palavra, um tanto pincelada por preconceito e dúvidas: pagã. Então, antes de tudo, vamos procurar entender o que é pagã, pagão, o que é paganismo. Essa palavra e suas derivadas, como já disse, vêm sempre acompanhadas por ideias errôneas, preconceituosas; até mesmo em dicionários, sua definição costuma ser mal colocada.
Na contrapartida de que muitos acham, o paganismo não tem nada a ver com o culto ao demônio ou, como algumas pessoas calcadas em definições mais antigas, não ser batizado. A etimologia da palavra pagão remete-nos a uma origem latina “paganus” que significa aquele que habita o “pagus”, ou seja, o campo, a natureza. Em termos religiosos, “paganus” é aquele que cultua os deuses e deusas da natureza. Nos primórdios da era cristã, a palavra passou a identificar, de forma genérica, toda a religião que não se baseia na adoração a Cristo, o que inclui o judaísmo, o islamismo, as religiões indianas e tantas outras.  Mas foi no auge da Idade Média, com a dominação da Igreja Católica, que a palavra começou a ser relacionada com a figura do demônio, ou Diabo, como o “conhecemos” hoje, um homem com chifres, patas de bode, cauda longa e segurando um tridente, claras referências às antigas forças da natureza que foram “demonizadas”, já que os Deuses da natureza, geralmente são representados por figuras que fundiam homem e animal. Aliás, eu costumo dizer que o Diabo, como se pinta, é criação da Igreja, não dos pagãos!
Os antigos Deuses foram ligados ao culto demoníaco, a forças malignas, a aberrações, o que é, no mínimo, contraditório, pois ninguém concorda que a natureza é algo maligno, então, por que suas manifestações seriam malignas?
As antigas crenças pagãs, no sentido original da palavra, na Europa (celtas, greco-latinas, germânicas etc.) foram banidas e absorvidas com a chegada do cristianismo. Alguns vestígios dessas tradições sobreviveram em forma de folclore, simpatias, crendices populares e podem, até hoje, ser identificadas tanto em países europeus como os colonizados por estes, como o Brasil. Bom exemplo disso é a existência das benzedeiras em bairros mais afastados do centro da cidade, ou no interior. Outros indícios encontram-se transformados em festas cristãs, como o Natal e o costume de enfeitar pinheiros, a Páscoa, que até hoje na Alemanha ainda é festejada como uma festa pagã, culto a Deusa Ostara, ou Eostre, que originou a palavra Easter, que é Páscoa, em inglês.


Esclarecidos a origem e significado da palavra pagão, voltemos à palavra Wicca.
Quando falamos em Wicca, ou qualquer outra forma moderna de paganismo, estamos falando de um resgate das antigas crenças, que envolve valores éticos, morais e espirituais.
De acordo com Gerina Dunwich, autora de Wicca – A feitiçaria Moderna, a definição é a seguinte:

A Wicca (nome alternativo da feitiçaria moderna) é uma religião de natureza Xamânica, positiva, com duas deidades adoradas e cultuadas em seus ritos: a Deusa (aspecto feminino e deidade ligada à antiga Deusa Mãe) e seu consorte, o Deus Cornífero (o princípio masculino).


Gerina Dunwich

            Essa definição, aparentemente simples, é bastante curiosa quando observada mais detidamente. Ao falar sobre Wicca, que se tornou uma designação alternativa para bruxaria moderna, a autora afirma que sua natureza é xamânica, o que implica certamente uma relação íntima e concreta com a natureza, porém não com deuses e deusas distantes, como o deus cristão, que habita um paraíso que não sabemos bem onde fica. Ela também cita a Deusa, a grande Mãe, e seu consorte, o que demonstra que a Wicca é crença duoteísta, o que pode então excluir outros deuses. Também fala de ritos, e isso nos remete sim às antigas crenças e seus rituais de agradecimento, solicitações, homenagens etc.
            Seria bom terminar o assunto por aqui, já satisfeitos com a definição de Gerina, mas, infelizmente, esse conceito parece não ser aceito com unanimidade entre os bruxos.
            Espalhados por todo mundo, bruxos modernos encontraram-se com uma imensidão de definições, crenças, livros, informações... todos relacionadas com a Arte, com a religião da Deusa, da Grande Mãe, todas se intitulando neo pagãs.
            Grupo de praticantes da nova religião tiveram de filtrar informações, estudar história, cultura, antropologia, religião e uma infinidade de assuntos correlacionados, precisaram adaptar antigos hábitos, rituais às suas realidades, assim, a Wicca tomou diferentes faces, em diferentes lugares do planeta, podemos dizer que nessa corrida maluca por uma definição, todos partiram de um mesmo ponto, mas chegaram a diferentes destinos. Assim, são muitas as definições de Wicca. Talvez nunca encontremos uma definição única que agrade a todos. Há uma verdade em cada uma delas relacionada com a realidade, a situação e o lugar onde recomeçaram a prática da bruxaria.
            Essas visões diferentes passaram a ser chamadas de tradições. Há tradições bastante ligadas à adoração da Deusa e do Deus, algumas bem equilibradas entre os princípios feminino e masculino, outras, porém, acabam, às vezes, até sem querer, enfatizando a presença da Deusa, o que nos faz pensar se não apenas trocamos um deus onipotente, onipresente e onisciente por uma deusa onipotente, onipresente e onisciente!
            Geralmente, a Wicca importa-se com o equilíbrio entre a deusa e o deus e abre também espaço para outras deusas e deuses, isso até por afinidade a um panteão, como o grego ou o indiano. E ainda há wiccanos que agregam santos a seus rituais.
            Tentando explicar, parece que os fatos complicaram-se mais, há uma confusão no caldeirão! Então, vamos tentar reunir fatos, história e dar uma luz que mostre a origem da Wicca.
            Entre os vários livros sobre a Wicca escritos em países e épocas diferentes, constatamos que a maioria deles comete dois erros; um é a afirmação que a Wicca surgiu na Pré-história, uns autores dizem, no período Neolítico, outros vão mais distantes ainda, no Paleolítico; outro engano é que a Wicca tem origens celtas. Essas duas afirmações, por si só, já são contraditórias, pois os Celtas surgem no cenário das civilizações europeias por volta do início do último milênio antes de Cristo, ou seja, milhares e milhares de anos depois do fim do período Neolítico.
            E qual a razão dessa contradição? Pois bem, vamos a uma explicação. Quando, na década de 50, na Inglaterra, a Wicca apareceu pela “primeira vez”, seu idealizador, Gerald Gardner, quis atribuir à nova religião um status histórico que ela não tem.
            Cabe aqui abrir um parênteses para explicar quem foi Gerald Gardner, já que ele é personagem chave nessa história.

          Nascido em Liverpool, 13 de junho de 1884, nutria um grande interesse pelo ocultismo, tendo participado de muitas das diversas ordens secretas que surgiam aos montes na Inglaterra dos fins do século XIX. Entre elas, Gardner envolveu-se com a Maçonaria, a Ordem Rosa-Cruz, a Golden Dawn, a Ordo Templi Orientis (O.T.O.) e outras mais. Além disso, era membro da English Folklore Society (Sociedade Inglesa de Folclore). Como funcionário da Coroa Britânica, Gardner viajou pelo mundo a diversas nações submetidas ao controle do Império Britânico, passando longas temporadas na Índia e na Malásia, onde travou contato com muitas culturas diferentes e exóticas.
Gerald Gardner


          Aposentou-se cedo, e dedicou seu tempo livre a suas pesquisas sobre as muitas tradições ocultas que conhecera. Naturalmente, também se interessava pelo passado e cultura do seu próprio povo, e dispensava atenção especial às descobertas sobre a cultura celta nas ilhas britânicas feitas na época. No final da década de 40, lançou um livro chamado High Magic's Aid (Com a Ajuda da Alta Magia), um romance que ele, posteriormente, disse incluir elementos verdadeiros das práticas mágicas dos grupos de bruxos ingleses. Ainda segundo Gardner, a divulgação desses segredos milenares teria sido autorizada pelos guardiões dessas antigas tradições. Em seguida, em 1954, lança Witchcraft Today (A Bruxaria Hoje), onde surge pela primeira vez a palavra "Wica" - assim mesmo, com um único "c". Nesta obra, Gardner narra seu contato com um antigo grupo de bruxos ingleses, que transmitia suas práticas em segredo geração após geração. Ele teria, então, sido iniciado por esse grupo secreto, e, como bruxo, poderia divulgar o que ele chama de "A Arte". Ainda segundo Gardner, o conjunto de cerimônias e práticas religiosas da Wica estava registrado num livro muito antigo, conhecido como Book of Shadows - o Livro das Sombras. Esse livro realmente existe, é um pesado volume de capa de couro sem inscrições, com textos escritos à mão e ricamente decorados. Pesquisas posteriores comprovam, porém, que a capa é muito mais antiga que as páginas internas, o que mostra que estas foram colocadas no local de um livro bastante antigo, do qual se aproveitou somente a capa. Os textos apresentam um inglês aparentemente elisabetano, típico do século XVII, mas a existência de palavras desconhecidas naquela época (além de incongruências gramaticais) comprova que, na verdade, não se tratam de textos muito antigos, mas sim tentativas de fazê-los parecerem velhos manuscritos. Segundo estes textos, as práticas ali descritas seriam as verdadeiras tradições dos antigos Celtas da Grã-Bretanha, preservadas ao longo das gerações por destemidos guardiões dos Conhecimentos. Isto fez com que muitas pessoas associassem a Wicca à religião dos Celtas.
Não podemos negar que muitos elementos das práticas wiccanas são inspirados nas tradições Celtas - a celebração de rituais sazonais, conhecida como a Roda do Ano, é um exemplo. O natural então seria que a palavra wicca (ou wica, no modelo original) fosse de origem Celta. Curiosamente, não é. A explicação mais comum apresentada por autores wiccanos dá conta de que se trata de um vocábulo do idioma saxão, que significa "dobrar, moldar" - representando a capacidade do bruxo em moldar e dobrar a natureza... Talvez tenha origem em outros vocábulos Saxões, como Vitega, ou Wetekey, que significam algo como profeta, vidente. A verdade é uma só: a Wicca, apresentada como a religião Celta, possui um nome saxão...
As contradições não param por aí. Segundo o Livro das Sombras do próprio Gardner, os trabalhos mágicos wiccanos são dedicados a um deus e uma deusa, respectivamente Cernunnos (o deus de chifres) e Aradia. Cernunnos é uma deidade amplamente conhecida dos Celtas, o que faz sentido. Aradia, porém, é uma obscura figura mitológica originalmente atribuída pelo mitólogo Charles Leland aos povos etruscos da Península Itálica - o que estaria fazendo Aradia nas tradições dos Celtas insulares? Certamente, o trabalho de Leland também serviu de inspiração para Gardner, pois o poema conhecido como The Charge of the Goddess (A Carga da Deusa), apresentado por Gardner, é uma adaptação da "Oração a Diana" publicada por Leland em 1896 em seu clássico livro Aradia: Evangelho das Bruxas (Editora Outras Palavras, 2000).
Quanto aos colegas de Gardner da Folklore Society, nenhum deles, por mais dedicados que fosse, jamais haviam ouvido sequer rumores da existência de um grupo de bruxos praticando antigas cerimônias no interior da Inglaterra. Isso já seria suficiente para colocar a perder todo o trabalho de Gerald Gardner. Um exame mais criterioso do conteúdo, contudo, mostra que ele fez uma rica pesquisa sobre as antigas tradições pagãs (pré-cristãs) europeias e tinha um desejo intenso de resgatá-las.
Muito do que Gardner apresenta está contido em dois destacados livros publicados na década de 20: The Witch Cult in Europe (O Culto das Bruxas na Europa) de Margaret Murray, e The White Goddess (A Deusa Branca), de Robert Graves. Ambas as obras resgatam elementos de antigos cultos a uma deidade feminina (a Deusa) pelos povos da Antiguidade - em especial gregos, romanos e celtas. Aparentemente, Gardner viu muito sentido nas obras, e quis resgatar essas tradições na forma de um "novo velho caminho". Pesquisas posteriores comprovaram que Margaret Murray, apesar de não estar completamente certa, estava na trilha certa quanto à existência de um culto ao Feminino em eras antigas - o trabalho de pesquisadores como Marija Gimbutas e Anne Baring em tempos mais recentes comprova isso. Fica então a pergunta: teria Gardner sido um charlatão, ou ele se atribuiu uma missão: resgatar, ainda que através de mentiras, as tradições pagãs pré-cristãs da Europa?
Gardner, sem dúvida, criou muitos elementos que caracterizaram, e caracterizam, a Wicca. Já vimos que diversas informações apresentadas por Gardner foram "emprestadas" de outros autores, como Leland, Murray e Graves - além do polêmico ocultista Aleister Crowley, com quem teve intenso contato. As práticas mágicas por ele descritas, envolvendo círculos mágicos, espadas rituais e evocação dos Quatro Elementos, têm origem em práticas comuns na Maçonaria e na Alta Magia, mas dificilmente representariam elementos da cultura Celta. A antiguidade que Gardner pretendia atribuir à Wicca era sem dúvida fruto de sua fértil imaginação, e os ritos de seu "Livro das Sombras", ricos em elementos sadomasoquistas (chibatadas, mãos e pés amarradas eram práticas comuns - sem mencionar o "Grande Rito", a união sexual do Sacerdote com a Sacerdotisa representando o deus e a deusa) tornam visíveis o experimentalismo sexual marcante de seu idealizador, e mais uma vez assinalam a influência recebida diretamente de Aleister Crowley. Indubitavelmente, há muitos elementos que, por si só, bastariam para que a Wicca caísse no esquecimento ou gozação, ou fosse lembrada apenas como mais uma das muitas "tradições misteriosas" falsamente resgatadas na virada do século XIX para o XX.

"Mister Crowley"


Mas a Wicca conquistou seu lugar e respeito, certamente apoiada por sua relação com valores ancestrais além do resgate da igualdade entre os sexos, da integração com a Natureza através da celebração dos festivais sazonais da Roda do Ano, da liberdade aliada à responsabilidade expressa pela lei wiccana (Se mal nenhum causar, faz o que desejar.), que formam elementos muito positivos trazidos pela tradição da Wicca, os quais ganham imediata aceitação, uma década depois, nos anos sessenta, através do movimento feminista iniciado nos Estados Unidos, da conscientização ecológica e da revolução sexual. A Wicca veio perfeitamente ao encontro da década de 60.
Mas a Wicca não parou aí, tomou um rumo independente. Ao contrário de diversos movimentos culturais ocultistas, não ficou presa aos conceitos e ideias de seu criador. Se por um lado a Teosofia ainda hoje vive em função do que escreveu Helena Blavatsky e é inconcebível pensar em Thelema sem os ensinamentos de Aleister Crowley, a Wicca literalmente separou-se de Gerald Gardner; e graças a nomes como Ray Buckland e Scott Cunningham, deixou de ser apenas um sistema mágico preso a rituais pré-concebidos e passou a ter um enfoque muito mais espiritual do que antes, muito mais filosófico do que prático. Sem abandonar os importantes pontos inicialmente apresentados, como a existência de um Divino Feminino (tão negado e sufocado pelas tradições judaico-cristãs), o respeito e a reintegração do ser humano à Natureza, a Wicca evoluiu para uma opção espiritual sutil, moderna, extremamente válida, consciente, capaz de descortinar uma nova visão do papel de cada indivíduo diante do universo.

Helena Blavastky



Ray Buckland e Scott Cunningham


"Se mal nenhum causa, faça o que desejar", um dos preceitos da Wicca, possibilita fazermos o que quisermos, desde que saibamos quais são as consequências de nossos atos. A celebração dos ritos da Roda do Ano, intimamente ligados ao desenrolar das estações, traz aos wiccanos a visão de que eles são parte do mundo natural, que os ciclos da Natureza exercem sobre todos nós (humanos, animais, plantas e minerais) uma poderosa influência – e, por isso, a Natureza deve ser compreendida e respeitada.
Outro ponto marcante na Wicca moderna é o seu desapego com a necessidade de provar um passado glorioso. Se antes a Wicca se dizia "a mais antiga religião da humanidade," ou "a religião dos antigos Celtas, celebrada há quinze mil anos" (...), hoje ela é vista como herdeira das antigas tradições, uma tentativa de se resgatar valores antigos para o mundo moderno. Os recentes estudos e descobertas sobre a verdadeira espiritualidade celta mostram que esta nada tem a ver com a Wicca, a não ser como fonte de inspiração e nada mais. Até porque os tempos são outros, as pessoas e suas necessidades mudaram, e a Wicca soube se adaptar aos dias de hoje, aos diferentes espaços e sociedades. Anacronismos, como a necessidade de um wiccano ser "iniciado na Arte" por outro praticante para ser considerado um verdadeiro bruxo, já estão descartados, a auto-iniciação é frequentemente aceita e respeitada.  A Wicca não é mais vista como sinônimo de Religião da Deusa, mas sim como mais uma de suas manifestações. Do mesmo modo, hoje, sabemos que a Wicca não é a única forma de bruxaria existente, nem tampouco é o mesmo que paganismo. São muitas as vertentes, muitas as formas de praticá-la, principalmente, por força da liberdade que a norteia, não possui um modelo rígido a ser seguido - nas palavras de Scott Cunningham:
...não há, como jamais haverá, uma forma 'pura', 'verdadeira' ou 'genuína' de Wicca. Não existem agências governamentais centrais, líderes físicos, profetas ou mensageiros universalmente reconhecidos. Apesar de certamente existirem formas específicas e estruturadas de Wicca, elas nem sempre concordam entre si no que diz respeito a rituais, simbolismo ou teologia. Devido a esse individualismo saudável, nenhum sistema ritual ou filosófico surgiu para destruir os demais.
          Hoje, a Wicca não afirma mais ser ancestral - ela é moderna; a Wicca não é mais um conjunto de ritos voltados à fertilidade - desenvolve a consciência das pessoas que a praticam; e não é mais um caminho iniciático reservado para "os eleitos" – é livre, democrática, aberta. Ainda existem aqueles que se agarram a conceitos como a "hierarquia" interna de algumas tradições iniciáticas, ou que supervalorizam a posição do "sacerdote" ou "sacerdotisa", a ponto de fantasiar seu ingresso neste ou naquele círculo wiccano, na velha Inglaterra, em Avalon, dizendo-se detentores do poder de iniciar e banir quem eles desejarem de sua Tradição. São indivíduos que buscam, basicamente, poder pessoal, ascendência, luz dos holofotes, dinheiro... Mas, felizmente, perecem.  A Wicca é muito maior do que eles.
No Brasil, a Wicca vem ganhando popularidade graças aos livros e revistas que vêm sendo lançados, por que não dizer a filmes, seriados e até desenhos animados de televisão, a organizações, grupos de estudiosos sobre o assunto e, principalmente, ao desejo de um número crescente de pessoas em transmitir uma alternativa para a eterna busca espiritual.
Por incluir uma conscientização do papel do indivíduo diante do todo - seja esse todo a família, a sociedade, ou o planeta (muitos wiccanos são ecologistas e pertencem a instituições e ONGs em favor da preservação da Terra.), a Wicca vem despertando o interesse dessas pessoas com a preocupação cidadã, em sua maioria jovens. Isto aumenta a responsabilidade daqueles que já estão nesse caminho, pois deles depende a visão que será criada da Wicca por aqueles que por ela se interessam. Uma inclinação existente por alguns dos elementos negativos que ainda sobrevivem (a mentira acerca das origens, exagerada carga teatral etc.) pode gerar uma percepção bastante distorcida da Wicca. Vejamos um exemplo: um círculo de indivíduos trajados de negro com capuzes a cobrir-lhes os rostos, usando pentagramas no peito e empunhando adagas apontadas para a Lua podem ser perfeitamente enquadrados na imagem de um grupo wiccano celebrando um "esbat" (o festival da lua cheia), mas igualmente wiccano é aquele indivíduo que, sozinho no fundo de seu quintal, sente a chegada da primavera ao observar os insetos voando por entre as flores de seu jardim, ou comemora a roda do ano em rituais solitários na quietude de seu quarto. Qual das imagens transmite uma sensação mais agradável aos olhares externos?
Isto nos traz à mente algumas considerações importantes sobre a bruxaria moderna: o que se deseja fazer da Wicca? Um sistema mágico que, através de encantamentos, lhe permita conseguir um objetivo, um emprego ou namorado novo, por exemplo? Uma religião "alternativa", riponga? Ou uma filosofia que seja capaz de mostrar que homens e mulheres são iguais, que humanos e a Natureza são partes de um todo, e que o ponto crucial para a compreensão dos mistérios da Natureza está no equilíbrio e não no confronto entre as polaridades? Na Natureza não existe bem ou mal - estes são conceitos humanos. A morte não é ruim, é transformação, seja em memória, em ensinamento, em saudade. A noite não precisa ser temida, a luz sempre projeta uma sombra. O importante é mantermos o equilíbrio, entre homem e mulher, vida e morte, entre as sensações e sentimentos, natureza e animais (racionais ou não) e recusarmos o preconceito, as predefinições. Sabermos que a Wicca é um caminho natural, que não precisamos de mais complicação em nossas vidas, instrumentos “mágicos” comprados em lojas sofisticadas, um “sacerdote” nos guiando e tirando nosso dinheiro através de cursos e certificados de magia. A magia está em todo nosso redor, no fluxo natural da vida, no desabrochar de uma flor, no vento antes da chuva, nos olhares, nos desejos, na poesia, na cozinha, na autoestima... basta olhar por aí...

As diferentes tradições

          Falei, no texto anterior, sobre diferentes tradições e vertentes, creio que é bom esclarecer melhor o que vem ser isso resumidamente:

Tradição Alexandrina: Uma tradição popular que começou na Inglaterra em 1960 e foi fundada por Alex Sanders. A maioria dos rituais são muito formais e baseados na Magia cerimonial. A Sacerdotisa representa o feminino e o Sacerdote o masculino. Nesta tradição ocorrem os rituais sazonais, que divide o ano entre o Rei do Azevinho e o Rei do Carvalho, e diversos dramas rituais tratam do tema do Deus da Morte/Ressurreição.
Tradicional Britânica: Uma tradição baseada na hierarquia. Os Rituais estão centrados na Tradição Céltica e Gardneriana.
Wicca Céltica: Uma tradição centrada nos elementos e símbolos da natureza, como por exemplo, as fadas, as plantas. A maioria das bruxas verdes e seguidores do druidismo seguem este caminho.
Tradição Caledoniana: Esta tradição é baseada nos rituais dos escoceses.
Tradição Picta: É uma das manifestações da bruxaria tipicamente escocesa. Seus rituais são mágicos e não filosóficos.
Bruxaria Cerimonial: Usa a Magia cerimonial para atingir os propósitos mais altos e algumas vezes materiais. Segue os princípios da Magia Cabalística e Magia Egípcia.
Tradição Diânica: Algumas bruxas diânicas só cultuam a deusa, outras bruxas utilizam esta tradição para romper com laços patriarcais predominantes muito tempo na terra.
Tradição Georgina: Foi criada por George Patterson, auto intitulado "Sumo Sacerdote Georgino". Essa tradição é eclética por ter uma gama enorme de rituais, como por exemplo, Celtas, Alexandrinos, Gardnerianos e tradicionais.
Ecletismo: São considerados ecléticos os bruxos que realizam vários rituais sem se prender a um único.
Tradição das Fadas: Teve origem entre os diversos povos europeus da Idade do Bronze que, ao migrarem para as colinas e altas montanhas por causa das guerras e invasões, ficaram conhecidos como Duendes ou Fadas. Existem hoje várias facções da Tradição das Fadas.
Tradição Gardneriana: Esta é a tradição que mais contribuiu para que bruxaria fosse difundida. Foi fundada por Gerald Gardner em 1950 na Inglaterra. Muitos rituais e trabalhos mágicos em numerosas tradições são originárias do trabalho de Gardner. O Gardnerianismo é uma tradição hierárquica onde a Sacerdotisa e o Sacerdote governam.
Tradição Hecatina: É uma tradição de Bruxos que buscam inspiração na Deusa Hécate e tentam resgatar seu culto.
Tradição Familiar ou Hereditária: Nesta tradição os bruxos são treinados por algum membro da família. Os Bruxos Hereditários ou Genéticos são pessoas que descendem de quem já tenha origem pagã.
Wicca Saxônica: Fundada em 1973 por Raymond Buckland, que era um Bruxo Gardneriano.
Tradição Teutônica ou Nórdica: Essa tradição é formada por pessoas que falam dialetos europeus como o norueguês e o inglês. Para realizar rituais, inspiram-se em deuses originários das religiões onde se falam os dialetos germânicos.
Tradição Asatrú: Facção das tradições teutônica e nórdica. Praticada por aqueles que se inspiram nos rituais e na religiosidade escandinava.
Tradição Algard: Fundada pela americana Mary Nesnick iniciada nas Tradições Gardneriana e Alexandrina. 
Bruxaria tradicional ou natural: Um Bruxo tradicional prefere o título de Bruxo a wiccano e define as duas filosofias como sendo diferentes. Um Bruxo tradicional baseia-se na história e religiosidade de seu país para criar seus métodos, como por exemplo, bruxos tradicionais brasileiros que incorporam elementos indígenas em seus rituais.
Bruxa(o) de cozinha: Sua espiritualidade gira em torno do fogo e do lar.
Bruxa(o) de quintal: Sua espiritualidade gira em torno do conhecimento das ervas, desde o plantio até a utilização na magia.
Bruxo solitário: Talvez seja a tradição mais abraçada hoje em dia, já que permite que a pessoa exerça a bruxaria sem se ligar a nenhuma tradição ou grupo.

          Entre as mais diversas tradições e vertentes ainda a há mistura delas, de fato, é difícil, hoje em dia, encontrar definições e preceitos precisos que limitem as maneiras de exercer bruxaria. Pode ser que em suas pesquisas, encontre outros termos e explicações, parece não ter fim. Hoje, se me perguntassem que tradição sigo, ficaria em dúvida para responder. Sou bruxa solitária, mas nem tanto... Sou bruxa de cozinha, mas de quintal também. Bem, creio que sigo a magia natural, pois é assim que ela se manifesta na minha vida. Você vai encontrar todos os tipos, encapuzados ou não, uns tradicionalíssimos, outros não. Mas fique atento aos Bruxos Charlatões!!!